quinta-feira, 30 de abril de 2009

Descaso com os Patrimônios Históricos da cidade

Por Ligiane Brondani e Cristiely Lopes



“São Borja é o primeiro dos Sete Povos a ser organizado na segunda fase das missões. Originário da redução de Santo Tomé (Argentina), cerca de 1900 famílias tendo a frente o padre Francisco Garcia, atravessaram o Rio Uruguai para fundar uma colônia de nome São Francisco de Borja”.


O trecho acima reflete um pouco da história do município, fatos resgatados por Eliane Coletto, que em sua Monografia de Especialização no Curso de Arquitetura da Universidade Regional Integrada (URI Santiago), resgata os locais de memória da cidade, que por sua importância, deveriam ser preservados tanto pelos moradores como pelo poder público. São Borja é conhecida como o Primeiro dos Sete Povos das Missões Jesuíticas, possuindo um legado histórico presente nas ruas da cidade. As construções não são tão antigas quanto a época missioneira, mas são do século XIX e representam um momento importante da cidade. O grande contraste desta história é o descaso da população com estes locais historicamente assentados.


Muitos são-borjenses têm a idéia de que a cidade parou no tempo, a julgar por sua aparência, em sua grande maioria antigas, e o fato da cidade ter um apelo histórico. Talvez por este motivo, falte um processo que mude essa mentalidade, para que a desvalorização não tome proporções maiores.


De acordo com Eliane Coletto, arquiteta e funcionária da Prefeitura Municipal da cidade, “estas casas que a gente hoje considera de valor histórico em São Borja são construções da época da primeira República de 1900. São prédios de origem colonial portuguesa com estilo espanhol misturado”, diz, ressaltando a importância dos prédios históricos. Apesar disto, é triste reconhecer que na cidade existem somente vestígios do período missioneiro. Um exemplo é a pedra jesuítica localizada em frente à Igreja Matriz. Essas pedras eram retiradas das construções antigas e utilizadas para novas fundações. “A igreja do centro era jesuítica. Ela foi construída aos poucos, então, por problemas de infiltração ou porque o padre achava que tinha que modernizar, iam alterando, mas acabou sendo demolida em função do desgaste operado pelo tempo. A atual é a quinta construção”, conta Coletto, ilustrando o descaso com a Igreja Matriz.


Por fazer parte dos Sete Povos das Missões, o município ainda carrega traços da época. Mas, muitas vezes, esses traços não são percebidas por grande parte da população. Conforme um estudo feito pela arquiteta, divulgado na revista Cultura e Memória, “a cidade possui o título de 'Cidade Histórica', concedido pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul, em 1994. Este título, que reconhece o valor histórico-cultural do município, não reproduz na comunidade um sentimento de identidade que aproximaria mais a população com a história de São Borja. Observa-se, porém, pela sociedade em geral, certo 'desleixo' em relação ao seu Patrimônio Cultural Tangível”, ressalta Eliane.


Alguns habitantes têm esperança de que haja resquícios materiais da época na Igreja Maria Imaculada, localizada no Bairro Passo, que teria sido construída por jesuítas. Porém, o que há de histórico na Igreja é somente o altar. Ali se encontram pedras, formas características e imagens que são de valor histórico e teriam sido construídos no período missioneiro.


Há ainda o fato de algumas famílias preferirem manter a estrutura antiga de suas casas, por motivo financeiro ou por não querer modernizar. Deixam para depois a idéia de conservar as origens, então os anos passam e as construções se deterioram ainda mais, até ficar inviável a restauração. De acordo com o arquiteto e urbanista, vice-presidente da Sociedade de Engenharia e Arquitetura em São Borja, Roberto Dornelles, a solução está nas formas de incentivos governamentais. “Acho que tem que ser criados incentivos, só que tudo passa pela vontade política, o que é lógico pra gente, a política esquece, porque não vai dar voto ou não surge retorno. Por exemplo, em Porto Alegre se preserva e tem incentivo pra quem o faz, não paga IPTU ou tem um fundo de reserva da cidade que contribui para pintar a casa. É que a cultura daqui nunca teve esta preocupação”, analisa. Ele acredita ainda que, “é como se você tem um álbum de fotografia, e se acontece de perder as fotos, você fica sem passado, sem lembrança de quando era pequeno, fica só na memória. E uma cidade que não tenha as casas antigas, seu passado preservado, é uma cidade sem alma sem história”, afirma o arquiteto.


Outra forma de conservação histórica estaria na exploração turística dos locais históricos. Entretanto, como o turismo local não existe, não há trilhas de acesso com placas e indicações de pontos que lembram o período missioneiro, não havendo até o momento um trabalho focado na parte urbanística da cidade. A questão da identidade visual deveria ser ressaltada para que turistas e até os próprios moradores se sentissem parte integrante da história.


Um bom exemplo de conservação do patrimônio é o Museu Getúlio Vargas, que é mantido pela Prefeitura, e encontra-se em perfeitas condições. A responsável pelo museu Verônica Dutra Krassmann conta com a ajuda de mais duas professoras municipais e estaduais concursadas e com especialização,conservam e cuidam do museu. “Pode haver mudanças durante os anos, mas estaremos enquanto corresponder às expectativas”, relata Verônica.


A importância de manter preservado um Patrimônio Cultural está no que representa para um povo ou uma nação, servindo como ligação entre presente e passado, auxiliando para que história não se perca ao longo dos anos. A preservação da história, pressupõe um projeto de construção do presente, fazendo com que um prédio, monumento ou uma praça faça sentido para os olhos dos cidadãos.


É necessário que a população entenda que conservar o patrimônio é preservar a própria identidade. Cabe ao Poder Público local, usar estas heranças históricas em seu próprio benefício, restaurando áreas degradadas, promovendo o que embeleza a cidade e proporciona melhor qualidade de vida à comunidade.

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